Em ação do
Ministério Público Federal no Amazonas (MPF/AM), a Justiça Federal condenou o
Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) ao pagamento de
indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 10 milhões aos índios
Tenharim e Jiahui, habitantes de terras indígenas situadas no sul do Amazonas,
sendo R$ 5 milhões para cada povo. A sentença reconheceu
os graves danos ambientais causados ao território e ao modo de vida tradicional
das etnias por obras na rodovia Transamazônica (BR-230).
O Dnit também
deverá recuperar as áreas degradadas pelas obras da rodovia realizadas sobre as
terras indígenas Tenharim Marmelo e Jiahui, em trecho próximo ao município de
Apuí, a ser delimitado durante a fase de execução da sentença. A vegetação das
margens de igarapés e rios, devastada pela construção da BR-230, também deverá
ser recomposta pelo órgão. A sentença prevê ainda outras medidas a serem
cumpridas, como a recomposição florestal na área de preservação permanente do
igarapé que teve o curso alterado pelas obras e reflorestamento com espécies
nativas para compensar o desmatamento realizado no passado.
Há determinação
ainda de aplicação de multa ambiental pelos danos causados pela realização de
diversas obras na rodovia Transamazônica, a ser aplicada pelo Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) conforme
a legislação atual. Tanto a multa como as indenizações por danos morais
coletivos deverão ser atualizadas e corrigidas monetariamente no momento do
efetivo pagamento, quando a sentença for cumprida, conforme determina a
Justiça.
De acordo com a
apuração do MPF/AM que resultou na ação, a empresa ASC Empreendimentos e
Construções Ltda. foi contratada pelo Dnit em 2008 para realizar serviços de
manutenção na rodovia BR-230, entre os quilômetros 400 e 619, área que abrange
parte da área indígena Tenharim Marmelo, e executou diversas intervenções na
região sem qualquer licenciamento ambiental e recuperação das áreas degradadas.
Relatório de
fiscalização do Ibama produzido em 2009, após recomendação do MPF para
suspender as obras de recuperação da rodovia, apontou a necessidade de
licenciamento ambiental em função da constatação de desmatamento e construção
de canteiros. O órgão apontou ainda que a realização da obra, no trecho das
terras indígenas, teria facilitado a exploração de jazidas de cascalho e a
retirada ilegal de madeira da área de proteção para reconstrução das pontes.
A terra indígena
Tenharim Marmelo teve o seu processo de demarcação concluído em 1996 e a Terra
Indígena Jiahui teve a demarcação homologada em 2004. Em termos populacionais,
os Tenharim abrangem, atualmente, 962 indígenas (737 na TI Tenharim Marmelo,
137 na TI Tenharim do Igarapé Preto e 88 na TI Sepoti). Os Jiahui totalizam 98
indígenas.
A ação tramita na
1ª Vara Federal do Amazonas, sob o número 5770-60.2010.4.01.3200.
Cabe recurso da sentença.
Descaso histórico
Na sentença, juíza
federal Jaiza Fraxe afirma que o impacto ambiental causado pela rodovia
Transamazônica na terra indígena Tenharim Marmelo e Jiahui “está fartamente
comprovada” no processo. A construção da rodovia – diz a decisão – destruiu
cemitérios indígenas, fomentou a exploração ilegal de minérios e madeira no
território daqueles povos que ocasionaram contaminação de recursos hídricos e
morte de peixes, e não houve sequer contestação dos órgãos processados.
“Desde sua
inauguração, em 1972, o governo federal jamais se preocupou em fazer um estudo
idôneo de impacto ambiental e social da rodovia. Nunca se falou em plano de
gestão de recursos hídricos. Não se delimitou as consequências para as
populações tradicionais e povos indígenas que habitavam aquele ethos. Não se
pensou no prejuízo para a biodiversidade e para a história e identidade da
nação”, sustenta trecho da sentença.
Para a Justiça, o
valor estipulado como indenização por danos ambientais morais coletivos “não
tem o poder de recompor os cemitérios destruídos, as festas e rituais como eram
realizados antes da Transamazônica. Também não trará de volta a memória, a
tradição e a cultura intactas dos dois povos indígenas afetados, mas irá
imprimir o caráter didático e pedagógico”, bem como garantirá a possibilidade
de empoderamento aos Tenharim e aos Jiahui.
Nenhum comentário:
Postar um comentário