A estiagem extrema que reduziu os
níveis de chuva e intensificou a vazante dos rios no sul da Amazônia este ano
comprometeu o abastecimento de água potável em Porto Velho, capital de
Rondônia. Banhada pelo rio Madeira, a cidade enfrentou uma crise hídrica entre
os meses de junho a outubro, quando faltou água para 60% dos moradores que
utilizam poços artesianos ou cacimbas para o abastecimento.
Segundo reportagem da Amazônia Real,
o maior município de Rondônia – com 34 mil km² de extensão – e área de expansão
da fronteira agrícola, Porto Velho também experimentou, no período da seca,
altas temperaturas e a fumaça dos incêndios florestais. As chuvas de novembro
já normalizaram o abastecimento na cidade. No entanto, um levantamento das
ações dos órgãos ambientais para enfrentar as secas feito pela reportagem da
Amazônia Real mostra que Porto Velho, com seus 511,2 mil habitantes, não está
preparada para as consequências da mudança do clima.
A Organização das Nações Unidas (ONU)
vem alertando reiteradamente, por meio de dados da Organização Meteorológica
Mundial (OMM), que o fenômeno climático El Niño (aquecimento das águas do
Oceano Pacífico) irá provocar secas e enchentes extremas e recorrentes na
Amazônia.
No dia 8 de novembro, a OMM lançou o
relatório “O Clima Global em 2011-2015” durante a Conferência da ONU sobre o
Clima (COP22), em Marrakech, no Marrocos. O relatório aponta que os eventos
extremos registrados entre 2011 e 2015 no mundo, entre eles as estiagens na
Amazônia, têm relação parcial com a mudança climática provocada pela emissão de
gases de efeito estufa (GGE)
Em outro alerta divulgado no dia 14,
a OMM diz que o ano de 2016 deve ser o mais quente da história do monitoramento
da temperatura mundial, iniciado no século 19.
Em 2014, Porto Velho foi a cidade que
mais sofreu com danos sociais e econômicos por causa da grande enchente daquele
ano do rio Madeira, quando também faltou água potável. Doze bairros e 14
distritos localizados na região ribeirinha ficaram inundados, o que provocou a
contaminação dos poços artesianos.
Por causa da estiagem extrema, no dia
30 de setembro deste ano, o rio Madeira atingiu o nível mais baixo do ano: 1,9
metros. Faltou apenas 34 centímetros para o nível do manancial atingir a marca
histórica da seca de 2005, que foi de 1,63 m medidos na estação de hidrologia
de Porto Velho, segundo dados do monitoramento do Serviço Geológico do Brasil
(CPRM), órgão ligado ao Ministério de Minas e Energia.
A partir de 3,28 metros, o nível do
rio Madeira fica restrito para navegação e captação d´água. A Companhia
Estadual de Abastecimento e Saneamento Básico de Rondônia (Caerd) diz que a
rede pública capta 70% da água distribuída do primeiro lençol freático do rio
Madeira, que varia de oito a 12 metros de profundidade.
“O rio secou tanto que danificou o
equipamento de captação. Ele começou a fazer a sucção de muito material sólido
e tivemos que providenciar a manutenção”, disse o superintendente regional da
Caerd, Vagner Marcolino Zacarini.
Rompimento de adutora
Não bastasse o problema da captação
de água no rio Madeira, o desmoronamento de um porto clandestino no bairro
Triângulo acabou rompendo uma adutora. A Caerd teve que interromper a
distribuição na capital.
“A adutora é uma tubulação de grande
diâmetro que transporta água do manancial [rio Madeira] até a estação de
tratamento. A tubulação rompeu e não deu para recolocar a máquina para saber o
tamanho do problema porque a área, além de muito instável, foi interditada. Nós
não nem tínhamos como saber se foi um rompimento parcial ou total”, disse Zacarini.
O rompimento da adutora afetou entre 10% e 20% do abastecimento do sistema principal da Caerd na cidade, reduzindo a distribuição em bairros periféricos e regiões mais altas, afirma o superintendente regional.
Na região ribeirinha do rio Madeira,
a Prefeitura de Porto Velho distribuiu água potável para 2.589 famílias (12.945
pessoas) em fardos de dez pacotes, cada um com 12 litros de água potável, a
cada 90 ou 120 dias. Essa quantidade é determinada por lei. “É só para beber. A
gente sabe que não é suficiente. É só para amenizar a situação”, disse Vicente
Bessa, da Secretaria de Projetos Especiais e Defesa Civil (Sempedec).
O avanço das queimadas
Além da estiagem severa, a população
de Porto Velho enfrentou no período da seca altas temperaturas e a fumaça das
queimadas. A vegetação ressequida da floresta e das áreas agrícolas propagaram
o fogo com rapidez em Porto Velho, afirma o coordenador do Centro Nacional de
Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais em Rondônia, Roberto Fernandes Abreu.
Ele diz que Porto Velho registrou os
dias mais quentes de 2016 em 31 de julho, com 37,5°C, e em 11 de setembro, com
37,1°C. Somadas à secura do ar e da vegetação criou-se uma “situação grave” na
cidade.
Apesar de alertas emitidos pela
agência espacial norte-americana (Nasa) de que a estiagem de 2016 seria severa
na Amazônia, o número de brigadistas do Prevfogo – agentes encarregados do
combate aos incêndios florestais, liderados pelo Ibama - foi reduzido pela
metade em Rondônia. O órgão é responsável pelo combate ao fogo em projetos de
assentamento de unidades de conservação federais e terras indígenas.
Atualmente, o Prevfogo conta com o
trabalho de 39 homens, sendo 13 brigadistas. O Ibama recebe dados diários de
satélites sobre a ocorrência de focos de calor. “Às vezes é difícil chegar ao
foco de calor indicado pelo satélite porque temos muitas áreas de difícil
acesso, e precisamos usar o helicóptero”, explicou Abreu.
Ele reconhece as dificuldades para se
atender toda a demanda. Entre os meses de julho a outubro, as brigadas
combateram 203 queimadas. “Infelizmente, muitos incêndios acontecem ao mesmo
tempo, não dá tempo de a gente chegar. De julho para cá foi mais de um combate
por dia. Temos que escolher as prioridades. Na área rural, raramente se chama
os bombeiros, os moradores se viram como podem”, disse Roberro Abreu, do
Prevfogo.
Já o Corpo de Bombeiros de Rondônia
combateu 627 incêndios em 2015. Neste ano, de janeiro a outubro foram 1.120
ações.
A corporação está presente em 14 dos
52 municípios do estado: Porto Velho, Candeias do Jamari, Ariquemes,
Machadinho, Buritis, Jaru, Ouro Preto, Ji-Paraná, Cacoal, Rolim de Moura,
Pimenta Bueno, Vilhena, Cerejeiras e Guajará-Mirim. “E em caso de necessidade
reforçamos as guarnições com tropas de outras unidades”, disse o comandante do
1º Grupamento dos Bombeiros, capitão Andrey Vinícius Ribeiro.
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