quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Às margens do Rio Madeira, Porto Velho enfrentou insegurança


A estiagem extrema que reduziu os níveis de chuva e intensificou a vazante dos rios no sul da Amazônia este ano comprometeu o abastecimento de água potável em Porto Velho, capital de Rondônia. Banhada pelo rio Madeira, a cidade enfrentou uma crise hídrica entre os meses de junho a outubro, quando faltou água para 60% dos moradores que utilizam poços artesianos ou cacimbas para o abastecimento.

Segundo reportagem da Amazônia Real, o maior município de Rondônia – com 34 mil km² de extensão – e área de expansão da fronteira agrícola, Porto Velho também experimentou, no período da seca, altas temperaturas e a fumaça dos incêndios florestais. As chuvas de novembro já normalizaram o abastecimento na cidade. No entanto, um levantamento das ações dos órgãos ambientais para enfrentar as secas feito pela reportagem da Amazônia Real mostra que Porto Velho, com seus 511,2 mil habitantes, não está preparada para as consequências da mudança do clima.

A Organização das Nações Unidas (ONU) vem alertando reiteradamente, por meio de dados da Organização Meteorológica Mundial (OMM), que o fenômeno climático El Niño (aquecimento das águas do Oceano Pacífico) irá provocar secas e enchentes extremas e recorrentes na Amazônia.

No dia 8 de novembro, a OMM lançou o relatório “O Clima Global em 2011-2015” durante a Conferência da ONU sobre o Clima (COP22), em Marrakech, no Marrocos. O relatório aponta que os eventos extremos registrados entre 2011 e 2015 no mundo, entre eles as estiagens na Amazônia, têm relação parcial com a mudança climática provocada pela emissão de gases de efeito estufa (GGE)

Em outro alerta divulgado no dia 14, a OMM diz que o ano de 2016 deve ser o mais quente da história do monitoramento da temperatura mundial, iniciado no século 19.
Em 2014, Porto Velho foi a cidade que mais sofreu com danos sociais e econômicos por causa da grande enchente daquele ano do rio Madeira, quando também faltou água potável. Doze bairros e 14 distritos localizados na região ribeirinha ficaram inundados, o que provocou a contaminação dos poços artesianos.

Por causa da estiagem extrema, no dia 30 de setembro deste ano, o rio Madeira atingiu o nível mais baixo do ano: 1,9 metros. Faltou apenas 34 centímetros para o nível do manancial atingir a marca histórica da seca de 2005, que foi de 1,63 m medidos na estação de hidrologia de Porto Velho, segundo dados do monitoramento do Serviço Geológico do Brasil (CPRM), órgão ligado ao Ministério de Minas e Energia.

A partir de 3,28 metros, o nível do rio Madeira fica restrito para navegação e captação d´água. A Companhia Estadual de Abastecimento e Saneamento Básico de Rondônia (Caerd) diz que a rede pública capta 70% da água distribuída do primeiro lençol freático do rio Madeira, que varia de oito a 12 metros de profundidade.

“O rio secou tanto que danificou o equipamento de captação. Ele começou a fazer a sucção de muito material sólido e tivemos que providenciar a manutenção”, disse o superintendente regional da Caerd, Vagner Marcolino Zacarini.


Rompimento de adutora

Não bastasse o problema da captação de água no rio Madeira, o desmoronamento de um porto clandestino no bairro Triângulo acabou rompendo uma adutora. A Caerd teve que interromper a distribuição na capital.

“A adutora é uma tubulação de grande diâmetro que transporta água do manancial [rio Madeira] até a estação de tratamento. A tubulação rompeu e não deu para recolocar a máquina para saber o tamanho do problema porque a área, além de muito instável, foi interditada. Nós não nem tínhamos como saber se foi um rompimento parcial ou total”, disse Zacarini.

O rompimento da adutora afetou entre 10% e 20% do abastecimento do sistema principal da Caerd na cidade, reduzindo a distribuição em bairros periféricos e regiões mais altas, afirma o superintendente regional.

Na região ribeirinha do rio Madeira, a Prefeitura de Porto Velho distribuiu água potável para 2.589 famílias (12.945 pessoas) em fardos de dez pacotes, cada um com 12 litros de água potável, a cada 90 ou 120 dias. Essa quantidade é determinada por lei. “É só para beber. A gente sabe que não é suficiente. É só para amenizar a situação”, disse Vicente Bessa, da Secretaria de Projetos Especiais e Defesa Civil (Sempedec).

O avanço das queimadas

Além da estiagem severa, a população de Porto Velho enfrentou no período da seca altas temperaturas e a fumaça das queimadas. A vegetação ressequida da floresta e das áreas agrícolas propagaram o fogo com rapidez em Porto Velho, afirma o coordenador do Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais em Rondônia, Roberto Fernandes Abreu.

Ele diz que Porto Velho registrou os dias mais quentes de 2016 em 31 de julho, com 37,5°C, e em 11 de setembro, com 37,1°C. Somadas à secura do ar e da vegetação criou-se uma “situação grave” na cidade.

Apesar de alertas emitidos pela agência espacial norte-americana (Nasa) de que a estiagem de 2016 seria severa na Amazônia, o número de brigadistas do Prevfogo – agentes encarregados do combate aos incêndios florestais, liderados pelo Ibama - foi reduzido pela metade em Rondônia. O órgão é responsável pelo combate ao fogo em projetos de assentamento de unidades de conservação federais e terras indígenas.

Atualmente, o Prevfogo conta com o trabalho de 39 homens, sendo 13 brigadistas. O Ibama recebe dados diários de satélites sobre a ocorrência de focos de calor. “Às vezes é difícil chegar ao foco de calor indicado pelo satélite porque temos muitas áreas de difícil acesso, e precisamos usar o helicóptero”, explicou Abreu.

Ele reconhece as dificuldades para se atender toda a demanda. Entre os meses de julho a outubro, as brigadas combateram 203 queimadas. “Infelizmente, muitos incêndios acontecem ao mesmo tempo, não dá tempo de a gente chegar. De julho para cá foi mais de um combate por dia. Temos que escolher as prioridades. Na área rural, raramente se chama os bombeiros, os moradores se viram como podem”, disse Roberro Abreu, do Prevfogo.

Já o Corpo de Bombeiros de Rondônia combateu 627 incêndios em 2015. Neste ano, de janeiro a outubro foram 1.120 ações.


A corporação está presente em 14 dos 52 municípios do estado: Porto Velho, Candeias do Jamari, Ariquemes, Machadinho, Buritis, Jaru, Ouro Preto, Ji-Paraná, Cacoal, Rolim de Moura, Pimenta Bueno, Vilhena, Cerejeiras e Guajará-Mirim. “E em caso de necessidade reforçamos as guarnições com tropas de outras unidades”, disse o comandante do 1º Grupamento dos Bombeiros, capitão Andrey Vinícius Ribeiro.

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